A pressão psicológica e emocional a que se autoinduzem, no sentido de encontrarem um namorado/a, fá-las muitas vezes acreditar que se não estão num relacionamento, estarão então fadadas à solidão e à infelicidade; e tão intensa pode ser a pressão, que algumas delas fazerem uma série de disparates, como namorar com quem não gostam, nem delas gosta, ou mesmo casar, só para não ouvir os comentários dos pais e/ou dos amigos já casados e com filhos. Meses ou anos mais tarde divorciam-se.
Mesmo quando a opção de vida passa por ficar só, este pode manter elevados níveis de bem-estar, tal como pessoas que vivem conjugalmente. Se bem que muitas vezes sejam considerados/as mais infelizes, e muitas pessoas beneficiem de um casamento feliz em termos de bem-estar, há muitos/as solteiros/as que se sentem felizes, com uma elevada satisfação com a vida. Tendem a ter mais disponibilidade e liberdade para as opções individuais ao longo do seu ciclo de vida, bem como mais tempo para se dedicarem ao trabalho e atribuírem a esta área da sua vida um maior significado. São também os/as solteiros/as que tendem a cuidar mais das relações de amizade, sendo que muitos amigos integram a família afetiva (tal acontece também nas pessoas que vivem conjugalmente, mas em menor percentagem). Porque um dos fatores importantes para o bem-estar são as relações significativas, esta é sem dúvida o grande desafio dos/as solteiros/as: manter e cuidar das suas relações importantes, e integrar as pessoas significativas nas suas rotinas, evitando assim uma eventual tendência para o isolamento.
Sucede, porém, que muitas vezes o ser-se solteiro/a resulta não tanto de uma opção deliberada, mas de uma série de circunstâncias que não propiciam o envolvimento afetivo, o que gera tristeza, angústia, ansiedade, frustração e, não raro, grande desespero. Estas pessoas podem até reunir os melhores predicados, contar com os melhores recursos, dotar-se do melhor repertório de competências relacionais – mas não encontram um/a namorado/a. Em comum partilham a carência afetiva e a procura de se sentirem aceites, valorizados/as, desejados/as e amados/as. Querem o mesmo, mas não se encontram. Ou encontram e logo se desencontram. Fica a sensação de vazio e a dúvida se um dia acontecerá de novo.
Muitas vezes, isto decorre de procurarmos uma ‘pessoa perfeita’. Este tipo de postura idealizadora, vigilante, e crítica pode intimidar os/as possíveis pretendentes, que vêem nas cobranças um fardo difícil de carregar. Muitos/as de nos queremos não pessoas, mas “super-pessoas”, que sejam super-românticas, super-atenciosas, super-atentas, super-empáticas, super-conversadoras, super-atraentes, super-sedutoras, super na intimidade sexual, super-tolerantes e compreensivas, super-calmas, super bem-sucedidas, super-pais/mãe e de preferência super-ricas. E, quando uma destas “coisas” falha, colocam-lhes um ponto de interrogação vermelho na testa, mesmo quando o passado recente demonstra que elas têm muitas dessas qualidades. Amor e “super” não conjugam nenhum verbo e podem ser inconciliáveis. Muitas vezes, quer ter-se controlo sobre o/a companheiro/a, tentando dominar e ditar o comportamento dele/a. Exigir mudanças na personalidade do outro, tentando transformá-lo em algo que não é, gerará sentimentos negativos e destrutivos para a relação. A descartabilidade da sociedade em que vivemos pode levá-lo/a a “deitar relações para o lixo” só porque essa pessoa não é como queria que fosse, não pensa nem é como você desejaria. Por outro lado, muitos de nós acreditamos na noção irrealista de uma relação perfeita, sempre ‘cor-de-rosa’, isenta de tensões, conflitos e problemas, em que a paixão é uma constante. Não existem relações perfeitas. O que existem são relações saudáveis que nos oferecem momentos perfeitos. E que se alimentam deles.
Outro aspeto a considerar é a dificuldade em administrarmos funcionalmente os nossos afetos: muitas pessoas (particularmente os homens) são educadas para ter uma carreira de sucesso e não para os afetos ou para falar de amor ou de sentimentos. São “super-carreiristas” no trabalho, mas muitos deles estão ainda no “secundário”, senão na “primária” no que toca à linguagem dos afetos, à empatia e ao descobrir das necessidades emocionais dos outros, e escondem as suas fragilidades e vulnerabilidades. Devemos estar alertas para não cairmos na tentação de achar que sabemos exatamente o que o outro pensa, o que sente ou o que vai dizer.
Homens e mulheres, apesar de quererem ter uma relação, amar e sentir-se amados, parecem falarem línguas diferentes. Eles não têm paciência para conversas sobre problemas da relação, porque pensam que elas passam a vida a inventar problemas. Elas sentem total indiferença da parte deles quando eles se recusam a falar sobre o amor e se afastam. Ambos pensam que a relação vai acabar assim que discutem mais do que cinco minutos. Como querem ter namorados? Mesmo quando estão numa relação, é difícil encontrarem-se.
Outras razões por detrás deste desencontro, pode ser o facto de o desespero ser sentido por quem está potencialmente interessado, o colocar nas mãos de outra pessoa a responsabilidade pela sua felicidade. É fundamental entender que somos responsáveis pela nossa própria felicidade, e que o/a companheiro será apenas alguém que participa da nossa vida. Independentemente de estarmos ou não numa relação e namoro, a pessoa precisa de valorizar-se, e manter as atividades e amizades que definem a sua identidade individual.
Pode também estar a acontecer que estejamos a projetar um/a no/a outro/a aspetos da nossa própria personalidade com os quais lidamos menos bem, ou a tentarmos resolver situações não resolvidas no passado. A minha prática clínica tem-me mostrado que muitos casais discutem e se separam, justamente porque projetam um no outro “dores” e sofrimento de um passado longínquo e de experiências mais ou menos marcantes.
Em grande medida, cabe-nos desenvolver a força interior necessária para subsistir à dureza dos desafios. Isto implicará, antes de mais, um entendimento compreensivo, tolerante e 'amável' de nós para conosco próprios/as. Como um boomerang, a experiência do Amor devolver-nos-á sempre o muito ou muito pouco que nos permitimos investir. Florbela Espanca resume-o em 'Mulher de Perdição': “Esquecia-se de que o amor vem à sua hora, e de que é ele quem escolhe essa hora, e não nós...”. A presunção narcísica é mais forte: queremos tomar para as nossas mãos as rédeas do mundo. Forçamos o que não pode ser senão espontâneo. E o resultado é a experiência de um sentimento postiço, não vivo, não vivificante.
Seja feliz consigo, solteiro/a ou não-solteiro/a! Chegando o Amor, pergunte-se: Como me sinto melhor? Comigo, ou ao seu lado? Se a resposta for a primeira, espere… Se for a segunda, conheça! E se continuar a sentir-se cada vez melhor, mais alegre e mais feliz… AME.
Saiba mais em consultório.
Carlos Marinho
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