A pessoa imatura IDEALIZA A VIDA AFETIVA e exalta o amor conjugal como algo extraordinário e maravilhoso. É natural que ao longo do namoro um certo ESTADO DE DESLUMBRAMENTO nos impeça de atentar friamente na realidade – fenómeno que Ortega y Gasset designou por “doença da atenção” – mas o prosaico e difícil convívio diário acaba por fazer aflorar a verdade e, à medida que a vida ordinária se vai desenrolando, A MÁSCARA CEDE LUGAR À IMAGEM REAL.
Para a pessoa imatura O AMOR FICA “CRISTALIZADO”, como diz Stendhal, na fase de deslumbramento, ao invés de aprofundar-se na “versão real” que então se desvenda. Esta CEGUEIRA AFETIVA leva a pessoa a viver para a parceria: AGE FREQUENTEMENTE COMO UMA CRIANÇA POSSESSIVA, atreita a CRISES DE RAIVA E CIÚME por TEMER NÃO SER AMADA o suficiente OU SER TRAÍDA a qualquer momento.
É um AMOR DESESPERADO QUE TIRA A LIBERDADE DA PARCERIA, porque a quer para si e dela tudo espera. Quando o amor é profundo, as divergências que se descobrem acabam por superar-se; quando é superficial, por ser imaturo, provocam conflitos e frequentemente ruturas.
Isto porque a pessoa afetivamente imatura DESCONHECE QUE OS SENTIMENTOS NÃO SÃO ESTÁTICOS, mas dinâmicos. São suscetíveis de melhora e devem ser cultivados no viver quotidiano. O amor inteligente exige o cuidado dos detalhes pequenos e uma ALTA PERCENTAGEM DE ARTESANATO PSICOLÓGICO: é uma tarefa esforçada de melhoria pessoal, durante a qual se burilam os defeitos próprios e os que afetam a(s) parceria(s).
Os amantes imaturos QUEREM ANTES RECEBER DO QUE DAR. Quem é imaturo/a quer que todos sejam como uma peça integrante da máquina da sua felicidade. Ama SOMENTE PARA QUE OS OUTROS O/A REALIZEM. Amar para ele/a é uma forma de satisfazer uma necessidade afetiva, sexual, e/ou uma forma de autoafirmação.
O amor acaba por tornar-se uma espécie de “COLA” QUE PRENDE OS OUTROS AO PRÓPRIO “EU” PARA COMPLETÁ-LO OU ENGRANDECÊ-LO. Mas esse amor (vamos antes chamar-lhe APEGO), que não deixa de ser uma FORMA TRANSFERIDA DE EGOÍSMO, desemboca na frustração.
Procura cada vez mais atrair os outros para si e os OUTROS VÃO PROGRESSIVAMENTE AFASTANDO-SE dele/a. Acaba abandonado/a por todos, porque ninguém quer submeter-se ao seu PEGAJOSO NARCISISMO; ninguém quer ser apenas um instrumento da felicidade alheia.
Sentem-se INSATISFEITOS E ‘TRAÍDOS PELA VIDA’ com as constantes decepções, pois ninguém é capaz de compreendê-los ou suprir-lhes as suas carências – na sua mente ressoa em repeat o mesmo mantra: “NINGUÉM ME AMA COMO EU GOSTARIA QUE ME AMASSEM”. Os sentimentos são caminho de ida e volta; deve haver reciprocidade. A pessoa imatura acaba SEMPRE A QUEIXAR-SE DA SOLIDÃO QUE ELA MESMA PROVOCOU por FALTA DE ESPÍRITO DE RENÚNCIA.
Não há amor sem renúncia. Um segmento essencial da afetividade está tecido de sacrifício –algo que não está na moda, que não é popular, mas que acaba por ser fundamental. O imaturo pretende INTRODUZIR O OUTRO NO SEU PROJETO PESSOAL DE VIDA, em vez de tentar contribuir com o Outro num PROJETO CONSTRUÍDO EM COMUM. A felicidade da parceria (eventualmente da família e dos filhos): esse é o projeto comum do verdadeiro amor. As pessoas imaturas não compreendem, por exemplo, que a dedicação aos filhos constitui um fator importante para a estabilidade afetiva dos pais. Também não assimilaram a ideia de que, para se realizarem a si mesmos, têm de se empenhar na realização da parceria. QUEM NÃO É SOLIDÁRIO/A TERMINA SOLITÁRIO/A.
O AMOR ADULTO
O AMANTE ADULTO não procura o amor para sentir-se satisfeito, à semelhança do amante infantil – já se sente COMPLETO, já se sente REALIZADO. Quando estabelece uma relação afetiva, FÁ-LO POR DESEJO E NÃO POR NECESSIDADE.
O seu objetivo na aventura do amor é encontrar alguém com quem PARTILHAR A VIAGEM DO CRESCIMENTO, como PESSOAS LIVRES E REALIZADAS que se escolhem para construir um projeto baseado na felicidade e na cumplicidade, enraizadas na realidade e não na fantasia cristalizada do deslumbramento.
Isto lembra que ser adulto numa relação significa também discriminar que AQUILO QUE INICIALMENTE ATRAI num/a parceiro/a nem sempre se traduz em algo com o qual a pessoa gostaria de viver PARA O RESTO DA SUA VIDA e ser capaz de compreender que não será ele/a o agente de mudança comportamental da parceria.
Isso leva a crer que o amor com maturidade requer um AUTOCONHECIMENTO MAIS PROFUNDO e um conhecimento também importante da pessoa com quem nos relacionamos, além do comprometimento do querer crescer – aqui, querer crescer no sentido de aprender habilidades na relação com o outro que possam produzir efeitos reforçadores para o outro e, a partir dessa interação, para si próprio, promovendo tanto o CRESCER PESSOAL como o CRESCER DA RELAÇÃO. A pessoa consciente, madura, sabe que O AMOR SE CONSTRÓI DIA APÓS DIA, lutando por corrigir defeitos, contornar dificuldades, evitar atritos e manifestar sempre afeição e carinho.
O AMANTE ADULTO |
O AMANTE INFANTIL |
•
Considera-se inteiro tal como é, não dependendo, dessa forma, de outra pessoa
para
sentir-se completo; • Sente-se
emocionalmente seguro e assim consegue tolerar/aceitar sentimentos de
tristeza e ansiedade (por exemplo), sem se deixar consumir por eles; • Identifica/
observa que é amado e não necessita de procurar os comportamentos da parceria
para prová-lo; • Assume
atitudes de responsabilidade pela sua vida, porém, discrimina que não pode
controlar tudo o que acontece; • Contempla as
suas necessidades sob uma perspectiva adequada e orienta a sua ação para
satisfazê-las; • Sente-se
capaz de avaliar as situações e fazer julgamentos baseados em dados da realidade,
além de incorrer atitudes saudáveis no que se refere à satisfação das suas
necessidades; • Aceita
comportamentos de imperfeição em si mesmo e nos outros e não se sente
humilhado ou temeroso quando comete erros;
• Planeia o
futuro enquanto vive o momento (aprendeu com o passado); • Possui capacidade
empática e flexibilidade suficiente para a mudança; • Discrimina
que ir além da sua zona de conforto é reforçador e essencial para o seu bem-estar
geral; • Consegue
aceitar a perda, todavia, nunca a de si mesmo. |
• Vê o outro
como extensão de si mesmo; • Sente que
inexiste fora da presença da pessoa amada; • Necessita
de constante reforço para sentir/saber que é amado; • Tem
comportamentos de dependência relativamente aos outros a fim de satisfazer as
suas necessidades físicas e emocionais; • Demonstra
grande dificuldade em gerir eficazmente as suas emoções; • Exerce
controlo sobre as situações para evitar o medo da traição, rejeição ou
abandono; • Teme as
mudanças e tende a evitar o esforço de produzi-las; • Vive apenas
o momento; • Vê-se como
o centro do universo; • As suas
necessidades são discriminadas como imediatas e desesperadas; • Lança mão
de quaisquer comportamentos para não perder a relação, optando inclusive por secundarizar-se
a si mesmo. |
COMO É ENTÃO POSSÍVEL VIVER-SE UM AMOR MADURO, CONSCIENTE E GRATIFICANTE?
Há que saber que a maturidade emocional NÃO VEM COM A IDADE nem com o NÚMERO DE DECEÇÕES ACUMULADAS no amor. Entre o amor infantil e o amor maduro, existe uma JORNADA DE INDIVIDUAÇÃO – de ‘nos tornarmos pessoa’.
Enquanto não atravessarmos A DOR DA NOSSA PRÓPRIA SOLIDÃO, a tendência é a de nos procurarmos noutras metades. E, claro, a de nos sentirmos permanentemente incompletos/as e insatisfeitos/as. Para viver plenamente em relação, é necessário, PRIMEIRO SER-SE UM/A. E neste esforço, CULTIVAR EM NÓS AS QUALIDADES QUE ESPERAMOS DO OUTRO. Seja INDEPENDENTE e transforme-se naquilo que deseja que os outros sejam consigo/para si: SEJA A PESSOA QUE VOCÊ GOSTARIA DE TER AO SEU LADO.
O amor infantil baseia-se na premissa de que “AMO PORQUE ME AMAM”. Já o amor maduro gira em torno de outra: “AMAM-ME PORQUE SEI AMAR, AMAM-ME PORQUE EU ME AMO”.
Quando somos abandonados/as pelo mundo (SOLIDÃO POR DESRELACIONAMENTO), a solidão é superável; mas quando somos abandonados/as por nós mesmos/as (SOLIDÃO POR DESCONEXÃO), a solidão é quase incurável. Para muitos/as de nós, a dor chega a ser tão intolerável que sentimos precisar de uma solução rápida para amenizá-la eficazmente: e escolhemos assim investir num novo amor e iniciar uma nova relação, como ANALGÉSICO PARA A DOR QUE O VAZIO DA AUSÊNCIA PROVOCA.
Embora atualmente se tenha já naturalizado a mudança rápida de parceiro/a, enfrentar tudo que uma rutura relacional implica não é fácil. Um analgésico far-nos-á sentir menos dor, MAS NÃO TRATARÁ O VERDADEIRO PROBLEMA. Na prática, dificilmente um coração magoado será curado através de uma nova relação. O mais provável é que apenas o tempo e a reconstrução de nós próprios/as possam consegui-lo.
Superar a dor do vazio implica CUIDARMOS DE NÓS PRÓPRIOS/AS, dando atenção às nossas NECESSIDADES EMOCIONAIS, concentrando foco e energia nos nossos PROJETOS E OBJETIVOS, reorganizando as nossas ROTINAS e criando NOVOS HÁBITOS POSITIVOS, criando CONVÍVIOS SAUDÁVEIS e investindo em ATIVIDADES PRAZENTEIRAS – darmo-nos ao mundo de forma total e autêntica. QUANTO MAIS NÓS PRÓPRIOS/AS FORMOS, MAIOR A NOSSA AUTOESTIMA. Estando bem por sob a nossa pele, não necessitamos já de usar o Outro como um refúgio onde a dor não tenha lugar. A partir daí o amor é apenas um complemento para expandirmos o nosso universo interior.
"O amor imaturo diz 'amo-te porque preciso de ti', e o amor maduro diz 'preciso de ti porque te amo'”
[Erich Fromm]
Carlos Marinho
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