Avançar para o conteúdo principal

A SABEDORIA DA INFIDELIDADE

A infidelidade – perpetrada ou desejada – é a causa mais frequente das separações. As traições românticas são tão devastadoras que podem DERIVAR TANTO EM DEPRESSÃO E SUICÍDIO, como em VIOLÊNCIA E HOMICÍDIO. Muitas são as razões pelas quais as pessoas enganam. Há quem o faça por MOTIVOS PURAMENTE EGOÍSTAS, FERIDAS AFETIVO-SEXUAIS ou PERTURBAÇÕES DE PERSONALIDADE. Não obstante, depois de conhecer alguns casos de adultério, percebo que – pelo menos em muitos caos – por detrás da incapacidade de se ser leal a uma só pessoa se oculta uma sabedoria emergente. 

Reconhecer alguma forma de sabedoria na infidelidade quase parece exaltar o pecador. Vejamos. Sem ânimo algum de negar a dor agonizante que a traição pode causar, estou convencido de que MUITAS PESSOAS ROMPEM O SEU VOTO MONOGÂMICO AO DAREM-SE CONTA – AS MAIS DAS VEZES DE FORMA INCONSCIENTE – DE QUE ESSA ESTRUTURA RELACIONAL JÁ NÃO É APROPRIADA PARA A SUA EVOLUÇÃO PESSOAL. 

Esta sabedoria inconsciente está também por detrás de muitos dos medos e conflitos que cada vez mais pessoas enfrentam diante do compromisso monogâmico. A procura de um prazer sexual maior – que as novas relações tendem a proporcionar – NÃO É SIMPLESMENTE HEDONISTA (e que há de errado com o hedonismo?). Frequentemente, esta procura emerge de necessidades profundas como a REGENERAÇÃO VITAL (“fi-lo para sentir-me vivo/a”, diz uma maioria das pessoas adúlteras em terapia), o AUTOCONHECIMENTO ou até a TRANSCENDÊNCIA ESPIRITUAL. 

SER-SE INFIEL OU TEMER O COMPROMISSO MONÓGAMO não significa necessariamente que sejas uma MÁ PESSOA, que NECESSITES PSICOTERAPIA ou NÃO AMES O/A TEU/TUA PARCEIRO/A (se não o/a amasses, deixá-lo/a-ias, certo?). Pelo contrário isto pode indicar que estás preparado/a para:

1. Romper com o MONOCENTRISMO;

2. RENEGOCIAR com o/a teu/tua companheiro/a o tipo de relação que quere sou necessitas;

3. Avaliar honestamente se continuar com o/a teu/tua companheiro/a te traz algum tipo de crescimento pessoal;

4. REINVENTAR O TIPO DE RELAÇÃO ÍNTIMA que necessitar para o teu crescimento, com ou sem relação atual;

5. Fazer-te MAIS AUTÓNOMO/A nas tuas decisões relacionais;

6. Reconhecer o poder regenerador, transformador e espiritual da ENERGIA SEXUAL;

7. Comprometeres-te com ALGO MAIS AMPLO do que uma só pessoa (e.g., a vida, o amor em si mesmo, a evolução humana).

Segundo este prisma, a suposição cultural de que todas as pessoas adúlteras estão ‘feridas’ e necessitam de cura acaba por ser um pouco míope. Em muitos casos, O QUE TALVEZ NECESSITE DE REPARAÇÃO NÃO SEJAM AS PESSOAS TRANSGRESSORAS, MAS A ESTRUTURA RELACIONAL EM QUE SE ENCONTRA, POR DEFEITO. O adultério, constate-se o óbvio, só existe dentro do monocentrismo: SEM VOTO DE EXCLUSIVIDADE SEXUAL, O ADULTÉRIO DESVANECE-SE. Isto não quer dizer que as pessoas poliamorosas não possam romper acordos – como o de não ter sexo desprotegido com terceiros –, mas as consequências são muito menores.

Em remate, quando se lhes garante o anonimato, uma alta percentagem de pessoas monogâmicas confessam que, se fosse por elas, ADORARIAM TER OUTROS VÍNCULOS SEXUAIS. Se não os procuram é, principalmente, porque temem que ao partilhar o seu desejo, o/a seu/sua companheiro/a queira fazer o mesmo, e isso é algo que dificilmente conseguiriam suportar sem a emergência dos CIÚMES.

Os ciúmes são um dos PRINCIPAIS OBSTÁCULOS À LIBERDADE RELACIONAL. Por um lado, impedem que muitos casais escolham o poliamor já que não podem tolerar a mera ideia de que a pessoa amada intime com outra pessoa. Por outro lado, algumas pessoas podem escolher – muitas vezes inconscientemente – o poliamor para minimizar os ciúmes que o apego exclusivo a uma só parceria lhes provocaria, já que ter outros vínculos amorosos pode minimizar o medo do abandono. Assim, dominar os ciúmes expande a liberdade relacional de todas as pessoas, independentemente do seu estilo relacional. 
Saiba mais em consultório.

Aqui para si.

Com estima,
Carlos Marinho



Comentários

Mensagens populares deste blogue

TUDO SOBRE FERIDAS EMOCIONAIS DE INFÂNCIA

FERIDAS EMOCIONAIS DA INFÂNCIA: O QUE SÃO E COMO NOS IMPACTAM?  A Patrícia está sempre a comparar-se aos outros. Acha-se inútil e desinteressante. Tem pouca autoconfiança e uma muito baixa autoestima, desde adolescente. Vive refém do medo de ser abandonada, apega-se em demasia aos amigos e, principalmente, ao seu parceiro. A experiência de ciúmes é constante. Assume que qualquer outra mulher é muito mais bonita e mais cativante do que ela. Não descansa enquanto não souber o que o seu parceiro faz, controla-lhe o telemóvel, persegue-lhe as colegas de trabalho, e acompanha-o em todos os movimentos. " Faço isso para que ele não me troque por outra pessoa " justifica. Ansiedade, angústia, medo e desconfiança tomam conta da sua vida há muito tempo. Mas estas emoções são apenas a ponta do iceberg, e o sintoma de um problema maior, oculto abaixo da linha de água - ali, onde em terapia encontramos as suas  feridas emocionais . [Quando cais e te magoas, podes imediatamente ver a ferid...

VINCULAÇÃO: ANSIOSA, EVITANTE E DESORGANIZADA

A forma como nos relacionamos afetivamente em adulto não nasce do acaso. Resulta, em grande parte, das experiências precoces que tivemos com as nossas figuras de cuidado - geralmente pais ou cuidadores significativos. A partir dessas vivências, aprendemos o que esperar dos outros, como regular as emoções e como equilibrar a proximidade e a autonomia nas relações. Este conjunto de aprendizados, conscientes e inconscientes, forma aquilo a que a psicologia chama padrões de vinculação (ou estilos de apego). Entre os principais, destacam-se três que tendem a causar maior sofrimento relacional: vinculação evitante, vinculação ansiosa e vinculação desorganizada. Compreendê-los é o primeiro passo para criar relações mais seguras, empáticas e autênticas. VINCULAÇÃO EVITANTE: - Associada a uma real ou percebida ausência das figuras cuidadoras, durante a infância, causando uma disposição para a independência emocional; - Preferem ocultar o que sentem, e fogem às conversas incómodas; - Tende a rec...

OS CORPOS DEVEM ESTAR LOUCOS (DA RECONEXÃO COM A NOSSA 'CRIANÇA INTERIOR')

INTRO O consultório clínico é, cada vez mais, uma estufa de queixas dirigidas ao medo que a ordem social vem tendo do CORPO. É da ordem social desconfiar de tudo quanto nos aproxime da animalidade, do ingovernável, do vulnerabilizante, e da paixão sensorial. Se hoje somos muito 'cógito pensante' e muito pouco 'corpo' , é - pelo menos parcialmente - porque a sociedade nos quer 'máquinas' de produção. Entre as pressas e atropelos das tantas solicitações e responsabilidades externas (que vão desde o trabalho ao consumo desmedido das redes sociais), o tempo deve ser rentabilizado a favor da aquisição de aptidões e competências que apurem o nosso valor mercadológico. Sobra-nos pouco tempo (bolsas de oxigénio) para nós mesmos/as (se é que algum), e menos disposição para compreendermos e cuidarmos da nossa interioridade. Nessa interioridade, as emoções são percebidas como obstáculos à produtividade, levando a que sejam reprimidas e controladas. Quando uma pessoa 's...