O que é a Perturbação
Obsessivo-Compulsiva (POC)? | A POC é uma doença caraterizada por
pensamentos recorrentes, incontroláveis e desagradáveis (obsessões) ou/e por
comportamentos repetitivos e ritualizados (compulsões), que a pessoa tem
dificuldade em evitar ou controlar. Quem sofre de POC reconhece que as suas
obsessões e compulsões são irracionais e excessivas, mas é-lhe difícil ter
controlo sobre elas.
OBSESSÕES | O que devo saber…
1. As obsessões são pensamentos, impulsos ou imagens,
intrusivos e indesejados, persistentes que criam ansiedade, medo, desconforto
ou mal-estar. O conteúdo dessas obsessões são sentidos por quem os tem como inaceitáveis,
sem sentido lógico ou de conteúdo bizarro, e que geram perturbação sob a forma
de ansiedade ou dúvida;
2. Estes conteúdos organizam-se em categorias de que
temas frequentes são: a possibilidade de fazer mal (a si mesmo ou a outros), agressão
e violência, sexo, religião, erros, aparência física, micróbios ou vírus,
doenças, necessidade de ordem e exatidão, entre outros. A maioria das pessoas
que sofre desta perturbação evidencia tipos múltiplos de obsessões e, ao longo
do tempo, tende a ir mudando de tipo de obsessões;
3. Todas as pessoas têm pensamentos intrusivos parecidos
com os conteúdos das obsessões (e.g., imagem de saltar da ponte para a
auto-estrada; pensamentos de conduzir o carro para fora da estrada ou de
encontro ao trânsito no outro sentido, impulso de saltar para os carris quando
o comboio se aproxima da estação; pensamento de ter deixado o carro destrancado…).
Estes pensamentos são uma produção natural do nosso cérebro como resposta aos
milhares de estímulos que recebemos. Portanto, não há nada de anormal no
cérebro das pessoas que têm POC, o que distingue é a atenção que as pessoas com
esta perturbação dão aos pensamentos, e o facto das pessoas que não têm POC
interpretarem o significado destes pensamentos de forma diferente (sem
representarem um ameaça).
Para pessoas sem POC estes pensamentos são ilógicos e
acabam por esquecê-los; as pessoas com POC tendem a interpretar incorretamente
estes pensamentos indesejados, atribuindo-lhes importância, um significado
especial, assumindo que são perigosos ou que representam uma ameaça real, que
podem ser um sinal de algo. “Se estou a
pensar numa coisa má, é porque é verdade”. Em suma, ao interpretar os seus
próprios pensamentos como perigosos ou ameaçadores, a pessoa vai sentir-se,
naturalmente, perturbada ou ansiosa. No entanto, é importante perceber que o
problema é a interpretação errada que se faz do pensamento intrusivo, e não o pensamento em si. O pensamento é uma experiência normal, que não faz mal nenhum.
Interpretá-lo incorretamente como perigoso faz com que ele se torne perturbante
para quem o tem;
4. Interpretar incorretamente alguns pensamentos
indesejados e intrusivos como perigosos leva não só à ansiedade, mas também à
vontade de resistir-lhes ou afastá-los da mente, ato no qual, por vezes, se
consome muita energia. De facto, uma reação universal a algo que nos provoca
medo ou ansiedade é evitá-lo. Se tiver medo de cobras é natural que evite ir
para o reptilário do jardim zoológico. Por isso, as pessoas que sofrem de POC
investem muita energia em evitar, anular ou neutralizar os seus pensamentos,
impulsos ou imagens mentais que lhes criem mal-estar, ansiedade ou até repugnância.
Infelizmente, também é uma reação universal aumentar-se a ansiedade face às
situações que se evita, porque isso não nos permite validar, na prática,
passando pela experiência, que não existe motivo para se recear essas
situações. A resistência a um evento interno (pensamentos, sensações, etc.) tem
por consequência última aumentá-lo de frequência ou intensidade. Tente, por
exemplo, não pensar num camelo. Agora que a proposta foi feita, talvez dificilmente
consiga. Ou seja, tentar afastar os pensamentos (o que se designa por supressão
de pensamentos) acaba por levar a um aumento na frequência dos pensamentos
indesejados.
5. Por vezes, as obsessões surgem na sequência de algo
tangível mas, noutras vezes, parecem surgir do nada. O carácter repetitivo das
obsessões também tem muito a ver com a forma como a pessoa interpreta este tipo
de pensamentos. Mais especificamente, assim que um pensamento intrusivo é
interpretado como ameaçador, ativa o sistema automático de detecção de perigo
da pessoa com POC (o sistema de fuga ou luta) o que a faz tornar-se
hipervigilante em relação àquilo que sente como uma ameaça. Esta é uma reação
normal e adaptada sempre que detectamos uma ameaça, porque nos ajuda a
protegermo-nos do perigo. No caso das obsessões POC, a ameaça que é
percepcionada é um pensamento intrusivo que seria perfeitamente normal, não
fora o facto de estar a ser percebido como uma ameaça. É esta interpretação
incorreta que faz com que as pessoas com POC se tornem muito preocupadas com os
seus pensamentos indesejados, como se eles fossem realmente perigosos. Esta
tendência a preocupar- se com eles faz com que se tenha mais consciência da sua
ocorrência, se esteja mais vigilante em relação à possibilidade de aparecerem e
com que eles ocorram com mais frequência.
Obsessões
Típicas | No número das obsessões mais comuns, contam-se:
- Obsessões de sujidade, micróbios e
contaminação: As obsessões de contaminação são mais frequentes no sexo
feminino (86%) e estão entre as mais frequentemente observadas (50% do total);
envolvem preocupações genéricas com sujidade e “micróbios” ou medos de
contaminação de carácter mais específico. A categorização dos objetos em seguros
ou perigosos, geralmente segue padrões ilógicos ou aleatórios. Os/as
clientes com obsessões de contaminação, além de rituais compulsivos de
lavagem, podem envolver-se em múltiplos comportamentos de proteção e de
evitamento, por vezes acentuadamente limitativos do funcionamento e campo
existencial do indivíduo. Os rituais de neutralização ou reparação (lavagens
do próprio e do meio) podem mesmo ser notoriamente invasivos e incapacitantes;
o indivíduo pode temer de tal forma a sujidade que até a sua família pode ser
repetidamente submetida a intermináveis rituais de purificação;
- Obsessões de dúvida patológica: Os/as clientes com dúvidas de
natureza obsessiva têm manifestas e constantes preocupações relacionadas com a
possibilidade de acontecer algo temível em consequência dum eventual descuido
seu, imputando-se a si mesmos/as, de forma excessiva, a responsabilidade pela
segurança dos outros. Usualmente, esta dúvida determina a realização de rituais
de verificação e também de comportamentos de evitamento, revelando
pensamentos e lógicas de atuação de carácter mágico (“…se não mexer a colher
três vezes, a minha mãe morre…”). A certeza absoluta nunca é alcançada e os/as
clientes sentem-se obrigados/as a voltar constantemente atrás, com o objectivo
de verificar se, de facto, fecharam o gás, se não atropelaram ninguém, etc. Em
última analise, a dúvida patológica constitui o verdadeiro núcleo de toda a
fenomenologia obsessiva;
- Obsessões
de impulso: O/A cliente é tomado/a por receios angustiantes de, de
forma irresistível e involuntária, poder cometer um acto incongruente,
repugnante, imoral ou criminoso (e.g., proferir obscenidades num acto
religioso; empurrar o bébé pela janela do
edifício; intoxicar o/a
filho/a com venenos domésticos; empurrar alguém escadaria abaixo; dar um murro no/a parceiro/a amoroso/a; cravar uma faca no peito do esposo quando ele chegar a
casa, etc.). Dada a natureza do seu conteúdo, este é talvez o tipo mais
perturbador de obsessões, na medida em que as pessoas tendem a envolver-se em rituais
de verificação e segurança, solicitando a tranquilização de outros
para se certificarem que os seus actos realmente não ocorreram;
- Obsessões
de necessidade de simetria: Esta designação refere-se à
necessidade de ordenar, de arrumar. Os/as clientes com este tipo de obsessão
referem sentir-se compelidos a repetir determinado ato motor até sentir que
foi bem feito. As pessoas com necessidade de simetria também podem apresentar lentificação
obsessiva, levando horas a desempenhar determinada tarefa (caso de um
cliente que gastava cerca de duas horas a escovar os dentes, sempre de modo
simétrico);
- Obsessões
somáticas: A atenção excessiva com a possibilidade de estar/ficar doente
leva a que, em função de vulnerabilidades pré-existentes, os/as clientes
desenvolvam comportamentos repetitivos de verificação de partes
do corpo e rituais de segurança, que muitas vezes consistem na procura
frequente de exames complementares de diagnóstico e de opinião médica
tranquilizadora.
- Obsessões sexuais: Refere-se a pensamentos/imagens sobre a sexualidade, quase sempre considerados repulsivos e imorais pela própria pessoas e pela sociedade. Os conteúdos mais comuns são: incesto, pedofilia, estupro, orientação sexual não-normativa, zoofilia, praticar atos sexualmente inapropriados (masturbação em público, tocar pessoas, fazer comentários inapropriados). Estes pensamentos levam a pessoa a duvidar da sua própria sanidade e a fazer autojulgamentos negativos, como achar que é uma pessoa má, impura e suja. Quando as obsessões estão relacionadas a pessoas próximas (como pai, mãe, filhos…) a tendência ao afastamento é enorme. Dado o teor das conteúdos, muitas pessoas sentem vergonha de si mesmas e também de partilhar a questão com os outras, principalmente por conta dos possíveis julgamentos. Isto faz com que a procura de tratamento seja difícil e que o sofrimento seja vivido de forma solitária. A combinação entre a autoimagem negativa e o afastamento de pessoas que são importantes é um fator que possibilita e facilita o surgimento de outras perturbações como é o caso da depressão.
Para alguns indivíduos, a ocorrência de alguns pensamentos é interpretada a partir de um significado especial, uma interpretação errada que pode provocar uma aflição, tornando esses pensamentos intrusivos normais, em obsessões, levando a pessoa a agir no sentido de diminuir as consequências desastrosas imaginadas e a aflição sentida através de rituais, o que se vai instalando ao longo do tempo.
Qual a
origem das obsessões? | A Perturbação OC é, sumariamente, um sintoma, e digo frequentemente aos/às meus/minhas clientes que o que eles/as têm de mais saudável são os sintomas. Primeiro, porque os sintomas são o melhor que as pessoas conseguiram desenvolver para lidar com as dificuldades: são a única resposta possível naquele momento ; e segundo porque não faz sentido ver os sintomas como défices, mas sim como limitações ou incapacidades de maior flexibilidade.
Muitas vezes, o que os sintomas nos procuram dizer é:
1: Conduzimos um estilo de vida com níveis doentios de stress e/ou uma rotina de maus hábitos;
2: Estamos rodeados de pessoas que não acrescentam nada de positivo à nossa vida e/ou drenam muito da nossa energia;
3: Estamos a evitar certas emoções: as emoções são absolutamente alicerçais para a orientação e para a motivação do nosso funcionamento adaptativo, e desempenham um papel essencial na resolução das tarefas de desenvolvimento características de cada fase do ciclo vital. Sendo da natureza das emoções virem à superfície, quanto as evitamos elas vêm sob a forma de sintomas. O evitamento pode ser cognitivo, afetivo ou mesmo comportamental; pode ainda dar-se por mecanismos de compensação (i.e., desenvolvimento de comportamentos que são o posto do que é prescrito pelas crenças: por exemplo, crenças em tornos de defeitos pessoais são substituídos por crenças narcísicas; ou, uma pessoa hiperdependente rejeita qualquer ajuda; ou, crenças em torno da incompetência suscitam uma recusa de todas as críticas).
4: Estamos ancorados a algum evento passado que ainda não conseguimos largar;
5: Estamos a precisar de uma mudança urgente de ambiente.
FATORES DE MANUTENÇÃO DA POC:
Atenção seletiva: Hipervigilância aos sinais de potencial ameaça (e como
estão muito atentos, acabam por encontrar);
Raciocínio emocional: A reação fisiológica a ameaças percebidas é uma
resposta normal do organismo, que o deixa instantaneamente preparado para lutar
ou fugir. Como são sensações desagradáveis, as pessoas com POC interpretam-nas
como um sinal de que é porque existe, realmente, uma ameaça;
Comportamento protetor e evitamento passivo: Como a pessoa acha que existe uma ameaça, comporta-se
de uma forma auto-protetora que lhe permita diminuir a ansiedade. Ao
proteger-se, no entanto, impede-se de aprender que, se não o tivesse feito,
nada de errado iria acontecer;
Esconder as obsessões: Muitas pessoas com POC optam por não falar sobre as
suas obsessões com os outros o que não lhes permite verificar que os
pensamentos intrusivos são normais;
Tentativa de controlo dos pensamentos: As tentativas de controlar ou suprimir os pensamentos
indesejados levam a um aumento desses mesmos pensamentos. Por vezes isso
aumenta a crença de que algo está errado.
A POC e
as DISTORÇÕES COGNITIVAS
As nossas
crenças ou convicções constituem aquilo em que acreditamos e que guiam as
nossas avaliações sobre nós próprios, sobre os outros e sobre o mundo. Desde
pequenos/as que se vão formando, com a contribuição sociocultural, dos pais e
familiares, dos amigos, dos nossos encontros com a realidade. A cada minuto que
passa vamos aprendendo algo sobre nós e sobre o que nos rodeia, levando-nos a
formular regras e teorias sobre como as coisas funcionam.
Às vezes, no
entanto, aprendemos coisas pouco úteis; outras aprendemos coisas que são úteis
naquele momento mas que, com o crescimento ou a evolução natural da sociedade,
se desatualizam; e outras vezes, aprendemos ainda coisas que são claramente
incorretas ou que nos fazem mal.
Distorção
cognitiva é uma forma disfuncional de percepção, normalmente ligada a regras
ilógicas sobre como interpretar as coisas. Tal como as crenças, as distorções
cognitivas resultam de um processo de aprendizagem. No caso da POC, o conjunto
de crenças e distorções disfuncionais características são as seguintes:
- Intolerância à incerteza: necessidade de ter a garantia de que se está 100% seguro. Qualquer pequena dúvida ou ambiguidade é interpretada de uma forma negativa e exagerada, como significando que é provável obter- se um resultado desfavorável. “Eu preciso de ter a certeza de que não deixei o gás ligado”;
- Estimativa exagerada da ameaça/perigo: a. Exagerar a probabilidade de resultados negativos e/ou b. Exagerar a gravidade das consequências negativas. “Se o tapete não estiver direito, o meu marido pode tropeçar e partir uma perna”;
- Estimativa exagerada de responsabilidade: Acreditar que se tem o poder de impedir resultados negativos. Acreditar, também, que não conseguir evitar o mal é o mesmo que causar o mal;
- Importância
dos pensamentos: Acreditar que pensamentos indesejados,
intrusivos e sem lógica são importantes ou, de alguma maneira, significam
algo.
a. Fusão moral entre pensamento e ação: crença de que os
pensamentos são moralmente equivalentes aos comportamentos – pensar e fazer é
moralmente a mesma coisa;
b. Probabilidade da fusão entre pensamento e ação: crença
de que se pensar em algo mau isso pode acontecer:
“Se eu pensar na
morte, estou a atrair a possibilidade de alguém de quem gosto morrer”;
- Necessidade de controlar os pensamentos: Acreditar que se pode e se deve controlar os pensamentos maus e indesejados; e de que esse controlo deve ser exercido para impedir maus resultados;
- Intolerância à ansiedade: Acreditar que a ansiedade e o desconforto podem manter-se para sempre ou entrar numa espiral descontrolada, levando à loucura ou a outras consequências negativas;
- Perfeccionismo: Acreditar que as coisas têm uma forma “certa” de ser feitas, equilibrada, completa ou perfeita e de que só assim se pode estar bem;
- Raciocínio
emocional: Acreditar que existe um perigo baseando-se no
facto de se sentir ansioso, ou seja, partir das emoções para justificar o
raciocínio, em vez de os encarar como categorias separadas. “Se me sinto mal, é porque está para
acontecer algo de mal”.
A POC e
outros FATORES PROBLEMÁTICOS:
Perfeccionismo
| O perfeccionismo é a tendência
para acreditar que existe uma solução perfeita para os problemas e é necessário
fazer aquilo que é perfeito. É um importante predictor de desajustamento social
e tem um papel a considerar na etiologia, manutenção e curso de vários estádios
psicopatológicos da perturbação obsessivo-compulsiva. As crenças passam por: “Se eu me esforçar bastante, o meu trabalho
sairá perfeito”; “Por mais que eu me
esforce, nunca será o suficiente”; “Se
eu pensar bastante tempo, poderei tomar uma decisão melhor e não cometerei
erros”, etc.
Dúvidas
| É frequente que os pacientes sejam invadidos por
obsessões e dúvidas, que se externalizam sobre a forma de indecisão e demora na
realização das tarefas, lentidão, dificuldade em tomar decisões, entre outros.
Isto está relacionado com a necessidade de não cometer erros e com o
perfeccionismo.
Responsabilidade
| O excesso de responsabilidade é um
dos grandes problemas desta patologia. Esta refere-se à crença de que é
necessário ter um poder decisivo para provocar ou impedir que desastres ou
factos negativos aconteçam. Devido a esta crença, a pessoa considera como sua a
responsabilidade de prevenir doenças, acidentes ou danos que resultam de erros
ou falhas morais involuntárias.
Em suma…
DESENVOLVIMENTO
DAS OBSESSÕES:
Estímulo precipitante que origina um pensamento/impulso/dúvida/imagem
intrusiva
+
Crenças disfuncionais e distorções cognitivas [Isto
vai gerar a interpretação errada de algo ameaçador e em consequência gera
ansiedade]
COMPULSÕES | O que devo saber…
O que é uma Compulsão? | Os
actos ou rituais compulsivos são comportamentos repetitivos (ex.: lavagem das
mãos) ou actos mentais (ex.: rezar, contar, cantar). Não são, em si mesmos,
agradáveis para o cliente e o seu objectivo é evitar ou reduzir a ansiedade ou
mal-estar que acompanha a obsessão, ou mesmo prevenir um acontecimento temido. Habitualmente este tipo de
comportamento é reconhecido como excessivo, ineficaz e sem sentido, pelo que o
indivíduo faz repetidas tentativas para lhes resistir. Contudo, em casos de
longa evolução, a resistência às compulsões pode ser mínima, quando o cliente
se rende definitivamente aos seus próprios rituais compulsivos. Podem ser visíveis ou atividades internas (coisas em
que se pensa). Por exemplo, a Maria recita uma pequena oração para afastar a má
sorte; trata-se de um exemplo de ritual mental. A Maria entra e sai do carro
até ter a certeza de que não existiu nenhum pensamento seu que pudesse ter
provocado uma infelicidade: este é um exemplo de ritual comportamental.
Compulsões
Típicas | No número das compulsões mais
comuns, contam-se:
- Compulsões de
Lavagem/Limpeza: Envolvem lavar repetidamente
as mãos, roupas, objetos pessoais; limpar; esterilizar objetos (roupas,
sapatos, cadeiras, toalhas, etc.) que tenham sido “contaminados” de alguma
forma; e banhos prolongados;
- Compulsões de Verificação: Os rituais de verificação são preventivos, procurando assegurar que
nenhuma catástrofe irá acontecer. O próprio cliente sabe que a possibilidade de
ocorrer aquilo que imagina é muito remota, mas mesmo assim não consegue
controlar a compulsão. Não são
inusuais, neste quadro, o medo de a casa incendiar por se deixar um
eletrodoméstico ligado ou o gás aberto, seguida da necessidade de verificar se
os aparelhos ficaram ligados ou não; o medo de a casa inundar porque a torneira
não ficou bem fechada, seguido da necessidade de apertá-la, ou passar a mão por
baixo para se certificar de que não está a sair nenhuma gota de água; e o medo
de que um ladrão entre na casa pelo fato de as janelas e portas não terem
ficado bem fechadas, tendo que verifica-las repetidas vezes;
- Compulsões
de Repetição/Toque: Os rituais compulsivos
implicam atos de repetição de maneira precisa, seguindo regras arbitrárias e
mágicas (sejam mentais, como rezar, repetir palavras, frases ou números, ou
físicas, como acender e apagar a luz diversas vezes para aliviar a ansiedade da
dúvida de ter deixado acesa; antes de subir escadas, colocar o pé direito,
tirar e colocar de novo ao mesmo tempo em que aperta a mão esquerda);
- Compulsões
de Simetria/Ordem: Sentir-se obrigado a colocar
objetos numa ordem e simetria pré-determinadas, como por exemplo, arrumar as
camisas pela cor, simetricamente ou uma gaveta obsessivamente organizada, ou os
objetos sobre a mesa de modo pré-estabelecido;
- Compulsões
de Colecionismo: A pessoa que tem esse
comportamento é caracterizada por juntar objetos, ter extrema dificuldade de
desfazer-se das coisas, não deitar nada fora. É comum encontrar na casa dessas
pessoas pilhas de jornais, embalagens de plástico, vidrinhos, etc. Um exemplo é
o caso de um homem que guarda, há 19 anos, jornais “por acaso”, sem nenhum
sistema de arquivamento ou busca.
As crianças, entretanto, podem juntar lascas da
própria unha, fios do próprio cabelo, e coisas assim.
Em suma…
DESENVOLVIMENTO
DAS OBSESSÕES E COMPULSÕES:
Estímulo precipitante que origina um
pensamento/impulso/dúvida/imagem intrusiva
+
Crenças disfuncionais e distorções cognitivas [Isto
vai gerar a interpretação errada de algo ameaçador e em consequência gera
ansiedade]
=
Desenvolvimento de comportamentos protetores [evitamento: rituais, neutralização, controlo de
pensamentos, o que reduz momentaneamente a ansiedade]
=
Aumento das Obsessões
Quais são as possíveis causas da POC? |
As
causas exatas de POC permanecem desconhecidas. Contudo os investigadores
suspeitam tratar-se de um desequilíbrio bioquímico no cérebro. É provável que
se trate de uma falha de neurotransmissão cerebral, especificamente a nível de
uma das substâncias (a serotonina) encarregue de transmitir as mensagens
neuronais entre células cerebrais que aparentemente regulam os comportamentos
repetitivos. Este desequilíbrio pode ser hereditário. Adicionalmente, fatores
psicológicos e do ambiente que provocam tensão nervosa podem agravar os
sintomas. No número dos fatores ambientais podemos contar crenças religiosas
e códigos morais muito restritos que podem contribuir para uma sobrevalorização
dos pensamentos; a patologia parece também ser mais frequente em sujeitos que
apresentam condições desfavoráveis, como por exemplo, divórcio, dependência
financeira ou desemprego; estilos parentais controladores/superprotetores.
Que tratamentos existem para a POC? | No
número dos tratamentos disponíveis para a POC, contam-se:
TERAPIAS
FARMACOLÓGICAS: Muitas das pessoas com POC necessitam de tratamento
medicamentoso. Os medicamentos que afetam a serotonina parecem ser mais
eficazes no tratamento desta doença. Há vários disponíveis e a sua escolha obedece
a critérios médicos, em conformidade com o perfil de cada doente;
PSICOTERAPIA:
Obsessões e compulsões andam sempre
de mãos dadas: as obsessões têm por resultado o aumento da ansiedade e as
compulsões permitem reduzi-la. É sobre esta ligação que se intervém em
psicoterapia, fragilizando-a até a romper. Para o modelo
cognitivo-comportamental, o comportamento obsessivo-compulsivo é interpretado
basicamente como sendo um comportamento de fuga ou evitamento a experiências
potencialmente negativas. Esta terapia consiste em ensinar ao cliente formas de
lidar com a ansiedade produzida pelas obsessões e a reduzir ou eliminar os
rituais compulsivos.
Prognóstico | O desaparecimento dos
sintomas é gradual (e não rápido, como ocorre em outras doenças, como a depressão
ou o pânico), podendo ser progressivo ao longo de vários meses. Daí a
importância de perceber o acompanhamento terapêutico como um processo gradual,
e tentativo, que deverá ser pautado por persistência e otimismo.
ALGUMAS
ESTRATÉGIAS A RECORDAR:
1. Mudança
de Narrativa Interior (com base no reconhecimento da perturbação): Como forma de modificar pensamentos disfuncionais,
estes devem ser postos em causa e contrastados com alternativas mais
funcionais. Isto pode ser feito através da colocação de questões tais como: “Que evidencias eu tenho de que os meus
pensamentos têm fundamento? Existe explicação alternativa?”. Uma forma de
mudar uma interpretação errónea é, portanto, construir e testar uma explicação
alternativa coerente. Pode assim propor-se a testagem de explicações
alternativas:
Ex: Temos duas teorias para explicar aquilo que
acontece:
A. Está de facto contaminado e precisa de se lavar
porque pode contaminar os outros.
B. É uma pessoa muito sensível a medos de ser
contaminado e reage a esses medos executando várias lavagens;
2. Aceitação
dos pensamentos (Técnica Paradoxal): Não
raro, nos casos de associação com responsabilidade, podemos adotar crenças
erróneas que inflacionam a importância dos pensamentos: “Se eu penso muito em alguma coisa, isso significa que de facto ela é
importante”, “Se eu penso que algo é
ou pode ser muito perigoso, é porque realmente é”, “Se um pensamento provoca muita aflição, é porque deve ser perigoso e verdadeiro”.
Mas podemos controlar inteiramente os nossos pensamentos? Eles necessariamente
revelam aspectos do nosso carácter ou personalidade, ou podem ser sintomas da
patologia? Podemos ser responsabilizados moralmente por um pensamento, imagem,
lembrança que não controlamos nem desejamos? Recorde-se:
ü
Não lute
contra pensamentos indesejáveis (recorde-se que o problema da ‘ansiedade’ não é
a sintomatologia em si, mas o acharmos que ‘não podemos estar ansiosos’);
ü
Não se
preocupe em perceber quando um mau pensamento o/a esta a invadir, pois quanto
mais se preocupar mais intensos serão: não lhe dê importância, nem faça nada
para o afastar;
ü
Não
neutralize o pensamento mau com um pensamento bom;
ü
Mantenha os
pensamentos o máximo de tempo possível até que não causem aflição (“dialogue”
com eles, integre-os na sua experiência, marque uma hora específica na agenda
para fazê-lo);
3. Aceitação
dos pensamentos seguida de foco noutras questões: envolver a mente noutra ideia ou numa actividade
(poderá ser útil uma atividade intelectual, como a leitura de um livro, a
realização de um trabalho, etc.);
4.
Ativação comportamental: devolva-se à
ação, não reduza a sua taxa de atividade. Contrarie a tendência para a estagnação
e o desânimo, envolvendo-se em atividades, preferencialmente estruturadas e
prazenteiras (e.g., ginásio, cursos/formações, associativismo, ações de voluntariado);
5.
Estratégias de relaxamento (e.g., o
treino de respiração diafragmática e exercício de relaxamento muscular
progressivo): A respiração diafragmática destina-se a reduzir alguns sintomas
somáticos e psicossomáticos associados a estados de ansiedade extrema. É
contrária à hiperventilação, sendo uma respiração lenta e profunda, oposta à
respiração rápida e superficial. O exercício de relaxamento muscular
progressivo permite ensinar a desenvolver aptidões de relaxamento, de modo a
que a aprenda e a aplique no contexto exterior à consulta. Envolve a contração
e o relaxamento de todos os grupos musculares. Inicialmente devem ser relaxados
todos os músculos e ao longo do tempo o grupo de músculos é reduzido até que consiga
relaxar só de pensar no conceito.
Saiba mais em consultório.
Aqui para si,
Com estima,
Carlos Marinho
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